Correio Popular Notícia



?E agora?? ou ?É agora??
*Por Denise Paiero O que quer a multidão que saiu às ruas, sem liderança, sem bandeiras claras? Os cartazes carregados por eles dão algumas pistas. Os gritos animados de ?é só o começo!? ainda ecoam nos meus ouvidos. Ainda meio atordoada com o movimento inesperado das ruas e acreditando na disposição dos que bradam que só está começando, pergunto-me: É só o começo de quê? Há dias me questiono: para onde vai essa história? Algumas características dessa multidão meio sem forma que tomou as ruas brasileiras podem ser percebidas se olharmos um pouco mais perto as manifestações. Acompanhei os manifestantes em São Paulo e uma das coisas que observei, em meio à multidão, foi que a qualquer movimentação mais agressiva de algum participante, o grupo gritava: ?Sem depredar!!!?, preocupado com o que havia acontecido em outras manifestações e tentando evitar que se repetisse. Outro pedido constante: ?Sem partidos!? era ouvido sempre que as bandeiras de partidos políticos de esquerda eram erguidas. A juventude sem partido é também a juventude sem bandeiras. Ou com muitas bandeiras. Ou melhor, com cartazes nas mãos escritos com a velha técnica cartolina /canetão, que tanto ajudou nossos pais, e os avós deles, nas manifestações pró-democracia. Mídia rápida, barata, que passa longe da tecnologia, e que permite gritar o que se queira e mudar de demanda quando se bem entender. Cartazes são leves, podem ser escritos na hora, podem ser compartilhados, transmitem mensagens instantâneas, para quem está perto e também para quem está fotografando. A tecnologia das redes sociais ajuda a reproduzir o que foi escrito no papel. ?Justiça!?; ?Liberdade aos manifestantes presos?; ?Fora Feliciano?; ?Fora Alckmin?; ?Fora Dilma?; ?Fora Haddad?; ?Fim da corrupção?; ?Abaixo a repressão?; ?Não é só por R$0,20?! Esses foram alguns dos cartazes que vi nas mãos dos manifestantes, havia dezenas, centenas de outros com as demandas mais variadas. Essa quantidade de reivindicações mostra uma insatisfação geral de uma geração que parece ter suportado todo tipo de incômodo calada, protegida do mundo real atrás das telas de computadores e que agora parece ter percebido a força que a presença física e a multidão têm. Havia um grupo de manifestantes que apontava para a própria participação no ato: ?Saí do Facebook?; ?Verás que um filho teu não foge à luta?; ?O gigante acordou?. Gritos de uma geração acusada de ser omissa, alienada. E que, agora, resolveu se mostrar e mostrar que está se mostrando. Seriam alienados ou seriam superprotegidos? Meninos de classe média, que não teriam nenhum motivo para protestar, como diria Arnaldo Jabor, antes de pedir desculpas e reconhecer que errou. ?Rebeldes sem causa?. Não teriam causas mesmo? Ou será que nós, já mais velhos e que tanto defendemos o direito de ir às ruas protestar, os educamos para que não tivessem motivos ? ou achassem que não têm? Entendo a surpresa de quem, como Jabor, num primeiro momento, não compreendeu o que eles estavam fazendo. Fomos todos surpreendidos! Eles não estavam alheios, embora pudessem, eles mesmos, acreditar que estivessem. Um dos slogans dessas manifestações é ?vem pra rua!?. Ele é curioso, já parte de uma inversão, pois surgiu de uma campanha feita pela FIAT para a Copa das Confederações que convoca a participação do povo na festa e afirma: ?Vem pra rua porque a rua é a maior arquibancada do Brasil?. O ?vem pra rua?, assim transformado, assusta os organizadores da própria competição esportiva. Porque eles, os manifestantes, não querem ir para a rua e ficar na arquibancada. Eles querem a rua como palco. A geração que hoje convida ?Vem pra rua? e que não aceita o ?vocês não podem estar aí? é exatamente a geração criada em bolhas. Eles quiseram tomar a rua da qual sempre foram protegidos. Eles estouraram a bolha. A análise dos cartazes e dos gritos entoados nas manifestações das últimas semanas ajuda a entender um pouco o cenário. Mas não permite perceber o que vai acontecer agora. Uma força enorme, sem lideranças, sem bandeiras claras é também uma força suscetível a virar massa de manobra ou a ser convencida por líderes de todo tipo. Vou continuar de olho na rua para tentar entender um caminho que me parece cheio de riscos. Por enquanto, estou entre o ?E agora?? e o ?É agora?? *Denise Paiero é jornalista e professora de Jornalismo na Universidade Presbiteriana Mackenzie, Doutora e Mestre em Comunicação e Semiótica. ...


Compartilhe com seus amigos:
 




www.correiopopular.com.br
é uma publicação pertencente à EMPRESA JORNALÍSTICA CP DE RONDÔNIA LTDA
2016 - Todos os direitos reservados
Contatos: redacao@correiopopular.net - comercial@correiopopular.com.br - cpredacao@uol.com.br
Telefone: 69-3421-6853.